Faixa a faixa: Lucas Olivra apresenta “…eu sei que eu disse…” de seu projeto dimy

texto de introdução de Diego Albuquerque Lucas Olivra é um multi-instrumentista, cantor-compositor e produtor que nasceu em Cachoeira, no Recôncavo Baiano, mas passou

May 27, 2025 - 20:25
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Faixa a faixa: Lucas Olivra apresenta “…eu sei que eu disse…” de seu projeto dimy

texto de introdução de Diego Albuquerque

Lucas Olivra é um multi-instrumentista, cantor-compositor e produtor que nasceu em Cachoeira, no Recôncavo Baiano, mas passou a maior parte de sua vida na capital, Salvador. Apaixonado por música desde pequeno, Olivra começou a tocar em bandas com amigos ainda no ensino fundamental. Aos 18 anos criou e integrou a banda de math-rock emo indie Ricardo Elétrico ao mesmo tempo em que lançava uma carreira solo com o projeto solo dimy. Foram dois EPs, um com a Ricardo (“Ricardo Elétrico”, 2013) e um EP instrumental com o projeto solo (“Tudo Que Eu Deveria Ter Dito Naquele Semestre”, 2015) e alguns singles ao longo dos anos com os dois projetos.

Com a pandemia de 2020 e a banda em hiato, era hora de realizar os planos de gravação para um disco da dimy, dessa vez incluindo vocais. E é desse processo que nasce “…eu sei que eu disse…”, produzido, gravado, mixado e masterizado pelo artista em seu estúdio caseiro. “Alguns desses riffs no violão de nylon datam de 2011/2012”, comenta Lucas. “Mas em 2016 eu encontrei um pendrive na rua com umas fotos, vídeos e documentos de textos que narravam parcialmente o início e fim no relacionamento de um casal”, complementa. Após uma busca sem sucesso em encontrar o dono do dispositivo, o músico decidiu juntar os instrumentais que tinha feito com as anotações, fotos e vídeos desta história de amor que encontrou no pendrive e concebeu o álbum.

Ao longo das cinco faixas do disquinho, cheias de violões de nylon e ares de lo-fi, indie, psicodelia jazzística e emo, Lucas apresenta essa história de amor em atos teatrais que iniciam com a embriaguez do amor, o ápice da paixão no relacionamento a dois, passa pelas péssimas decisões tomadas pelo nosso protagonista além do clima de derrota com o fim do relacionamento e a contemplação de todo um futuro pra remoer passados e errar várias outras vezes. “Eu acho que é uma história tão única a desse casal. Ao mesmo tempoa acredito que muita gente pode se identificar. É uma celebração do amor jovem, inconsequente e imaturo ao mesmo tempo em que é um olhar sincero e simpatético à mágoa e a decepção que o amor pode causar”, finaliza o artista.

O trabalho é mais um lançamento do selo fazenda elétrica records, criado pelo artista, e você ouve no seu streaming favorito clicando aqui. Da o play e saca o faixa a faixa feito pelo Lucas para entender melhor a história:

01) “nove da manhã, o exorcista, uma ressaca da disgraça”: A música que apresenta o disco inicia-se com os violões de nylon em estéreo, em um compasso de 5/4 que remete, de longe, a uma valsa. Nosso protagonista acorda sob efeito de uma severa intoxicação alcoólica com efeitos colaterais de paixonite aguda. Os violões de nylon fazem uma dança complicada com os violinos e os trompetes que adornam com delicada doçura o início de um novo amor banhado em álcool.

02) “vejo flores em você”: Esse deve ser um dos riffs mais antigos que eu tenho. Lembro vividamente de estar tocando o verso e o refrão dessa música para um primo meu em Arembepe lá em 2011. Nessa faixa nós acompanhamos nosso casal enquanto eles vivem o ápice de suas paixões, andando em bares, sendo enganados para entrar se converter em igrejas, festas, amizades. O refrão, porém, entra com uma guitarra pesada, anunciando que as primeiras falhas no relacionamento começam a aparecer, as incompatibilidades, o ciúme, um presságio perverso sem face espreita e segue nossos protagonistas

03) “um segredo sob seu travesseiro”: A terceira faixa possui uma cadência em marcha fixa. As guitarras distorcidas e a bateria rígida criam uma ambientação opressora enquanto que os violinos, trompetes e gaitas lamentam as péssimas decisões tomadas pelo nosso protagonista. O desejo enquanto uma força sombria, permeia a vivência em casas sem adultos e sem janelas. No quarto bom da casa, a vista dá pra debaixo da ponte e às vezes o melhor que duas pessoas que se amam podem fazer é se separar. “Explica, mas não justifica” seria o tema resumido dessa música.

04) “inverno”: Depois do show vem o bis, mesmo se o show for ruim. Nessa música o clima é de derrota, arrependimento e confusão. Essa música retrata uma noite de festa, desejo, antagonismo e é o momento em que se parte a barragem metafórica que armazenava os sedimentos dos sentimentos. O tom melancólico e cíclico dos violões parece anunciar o inevitável: a morte da tulipa, o fim do simulacro de um relacionamento. Não com uma explosão, não com uma briga, mas como uma longa, complexa e demorada série de decisões e pequenas mágoas que acumulam e afastam duas pessoas que se amavam em algum momento.

05) “a guerra fria”: A música que fecha o disco é uma meditação solene sobre um fraseado repetitivo do violão de nylon. Ao longo da música nós acompanhamos o desfecho do nosso protagonista anos após o fim da relação. Conforme a história é descrita, guitarras distorcidas são adicionadas à mistura criando uma espessa nuvem de texturas que oferecem dimensão e vazão aos sentimentos de culpa, amor e perdão que fecham a obra.

– Diego Albuquerque é o criador do blog Hominis Canidae, um dos maiores repositórios de discos brasileiros da última década. O blog foi criado em 2009, no Recife, e divulga novos artistas e nomes indies da música brasileira, de norte a sul do país.