Flattery ‘bajulação’ na Interacão-Humano Tecnologia
Projetando interfaces que encantam.Filme Coach Carter. Fonte: Empire OnlineE se os computadores usassem a mesma abordagem de elogios excessivos, não para nos enganar, mas como uma forma de nos encorajar a atingir nossos objetivos?A palavra flattery vem do verbo francês flatter, que significa elogiar de forma excessiva ou louvar, muitas vezes com o intuito de agradar ou seduzir alguém de maneira falsa. Em português, flattery pode ser traduzido como “bajulação”.Para entender por que elogios exagerados podem ser persuasivos, mergulhei na literatura da psicologia social e encontrei estudos de pesquisadores como Jones (1964) e Pandey & Kakkar (1982), que investigaram o efeito da bajulação na cognição humana. Mais especificamente, no impacto causado no receptor (a pessoa que recebe o elogio). Esses estudos demonstraram que o receptor tende a acreditar que o emissor (quem faz o elogio) está dizendo a verdade.Mesmo quando o receptor percebe que o elogio pode não ser totalmente sincero, ainda assim há uma tendência a aceitar sua veracidade parcial. Isso sugere que o conteúdo do elogio ativa um reconhecimento interno, emocional ou aspiracional, que transcende a literalidade da mensagem.Neste artigo, exploro como o conceito de flattery ou elogios excessivos, pode ser aplicado no design de interfaces de forma ética e estratégica. A proposta não é manipular o usuário, mas sim utilizar recursos expressivos com o objetivo de motivar, engajar e criar experiências mais positivas. Espero que este conteúdo contribua com sua prática como designer de sistemas interativos, oferecendo novas perspectivas sobre como tornar a interação mais humana, empática e significativa.Elogios na interfaceNa área de Interação Humano-Computador (IHC), o conceito de flattery ou bajulação em interfaces interativas foi inicialmente explorado por Fogg e Nass (1997). Segundo os autores, “os alvos da bajulação tendem a aceitar as mensagens como verídicas, sendo que tanto os elogios falsos quanto os sinceros podem induzir os mesmos efeitos” (Fogg & Nass, 1997, p. 552).Essa constatação revela que, independentemente da veracidade, o elogio em sistemas interativos pode produzir respostas emocionais positivas, sugerindo um viés social automático nas interações com tecnologia. Isso se dá porque, como seres humanos, somos profundamente sociais e emocionais e essas características influenciam tanto nossas interações com outros humanos quanto com máquinas que simulam comportamentos sociais.Na comunicação humana, o significado muitas vezes ultrapassa o literal.Por exemplo, ao dizer “você é uma gatinha”, não se afirma que alguém pertence à espécie felina; trata-se de uma construção social e cultural que implica beleza ou charme. O receptor entende esse subtexto. Essa camada simbólica da linguagem é transportável para o design de sistemas, especialmente ao considerar a metáfora de computadores como atores sociais. Conforme argumenta Hassenzahl (2010):A emoção é central na experiência do usuário e não apenas um subproduto.Nesse sentido, acredito que o design de sistemas interativos deve ir além de forma e função. É fundamental explorar aspectos emocionais, sociais e simbólicos da comunicação, para criar produtos que não apenas funcionem, mas que também evoquem significado e conexão emocional (Hassenzahl, 2013). O foco exclusivo em usabilidade e eficiência ignora as motivações subjetivas, estéticas e afetivas dos usuários, que muitas vezes desejam experiências mais envolventes.O modo como um sistema “fala” com o usuário importa. Mensagens de interface podem ser diretas ou indiretas, neutras ou carregadas de intenção persuasiva. A tecnologia, como no diálogo humano, pode se engajar em formas de comunicação que envolvem metáfora, humor ou afeto; formas estas que têm o potencial de ampliar a eficácia emocional e social da interação.Nesse contexto, o computador atua como um agente social, capaz de moldar comportamentos, reforçar hábitos e desenvolver habilidades; especialmente quando incorpora estratégias comunicativas baseadas em flattery. A Captologia (Captology: Computers as Persuasive Technologies) e o paradigma CASA (Computers as Social Actors) reforçam essa visão: os usuários tendem a aplicar heurísticas sociais a computadores que exibem características humanas.Historicamente, os computadores eram vistos apenas como ferramentas técnicas caixas de processamento sem agência. Máquinas como o ENIAC não se comunicavam com o usuário de forma simbólica ou emocional. Hoje, porém, sistemas são projetados para conversar, interagir e até provocar reações, seja por meio de mensagens simpáticas como “Segure firme, estamos quase lá!” ou por micro-interações.Se computadores podem evocar atributos humanos, então também podem utilizar recursos sociais como humor, elogio e simpatia. Esses elementos não são meramente decorativos, mas instrumentos estratégicos de design para construir vínculos, reduzir a fricção da interação e incentivar o engajamento. Ainda assim, é essencial refle

Projetando interfaces que encantam.

E se os computadores usassem a mesma abordagem de elogios excessivos, não para nos enganar, mas como uma forma de nos encorajar a atingir nossos objetivos?
A palavra flattery vem do verbo francês flatter, que significa elogiar de forma excessiva ou louvar, muitas vezes com o intuito de agradar ou seduzir alguém de maneira falsa. Em português, flattery pode ser traduzido como “bajulação”.
Para entender por que elogios exagerados podem ser persuasivos, mergulhei na literatura da psicologia social e encontrei estudos de pesquisadores como Jones (1964) e Pandey & Kakkar (1982), que investigaram o efeito da bajulação na cognição humana. Mais especificamente, no impacto causado no receptor (a pessoa que recebe o elogio). Esses estudos demonstraram que o receptor tende a acreditar que o emissor (quem faz o elogio) está dizendo a verdade.
Mesmo quando o receptor percebe que o elogio pode não ser totalmente sincero, ainda assim há uma tendência a aceitar sua veracidade parcial. Isso sugere que o conteúdo do elogio ativa um reconhecimento interno, emocional ou aspiracional, que transcende a literalidade da mensagem.
Neste artigo, exploro como o conceito de flattery ou elogios excessivos, pode ser aplicado no design de interfaces de forma ética e estratégica. A proposta não é manipular o usuário, mas sim utilizar recursos expressivos com o objetivo de motivar, engajar e criar experiências mais positivas. Espero que este conteúdo contribua com sua prática como designer de sistemas interativos, oferecendo novas perspectivas sobre como tornar a interação mais humana, empática e significativa.
Elogios na interface
Na área de Interação Humano-Computador (IHC), o conceito de flattery ou bajulação em interfaces interativas foi inicialmente explorado por Fogg e Nass (1997). Segundo os autores, “os alvos da bajulação tendem a aceitar as mensagens como verídicas, sendo que tanto os elogios falsos quanto os sinceros podem induzir os mesmos efeitos” (Fogg & Nass, 1997, p. 552).
Essa constatação revela que, independentemente da veracidade, o elogio em sistemas interativos pode produzir respostas emocionais positivas, sugerindo um viés social automático nas interações com tecnologia. Isso se dá porque, como seres humanos, somos profundamente sociais e emocionais e essas características influenciam tanto nossas interações com outros humanos quanto com máquinas que simulam comportamentos sociais.
Na comunicação humana, o significado muitas vezes ultrapassa o literal.
Por exemplo, ao dizer “você é uma gatinha”, não se afirma que alguém pertence à espécie felina; trata-se de uma construção social e cultural que implica beleza ou charme. O receptor entende esse subtexto. Essa camada simbólica da linguagem é transportável para o design de sistemas, especialmente ao considerar a metáfora de computadores como atores sociais. Conforme argumenta Hassenzahl (2010):
A emoção é central na experiência do usuário e não apenas um subproduto.
Nesse sentido, acredito que o design de sistemas interativos deve ir além de forma e função. É fundamental explorar aspectos emocionais, sociais e simbólicos da comunicação, para criar produtos que não apenas funcionem, mas que também evoquem significado e conexão emocional (Hassenzahl, 2013). O foco exclusivo em usabilidade e eficiência ignora as motivações subjetivas, estéticas e afetivas dos usuários, que muitas vezes desejam experiências mais envolventes.
O modo como um sistema “fala” com o usuário importa. Mensagens de interface podem ser diretas ou indiretas, neutras ou carregadas de intenção persuasiva. A tecnologia, como no diálogo humano, pode se engajar em formas de comunicação que envolvem metáfora, humor ou afeto; formas estas que têm o potencial de ampliar a eficácia emocional e social da interação.
Nesse contexto, o computador atua como um agente social, capaz de moldar comportamentos, reforçar hábitos e desenvolver habilidades; especialmente quando incorpora estratégias comunicativas baseadas em flattery. A Captologia (Captology: Computers as Persuasive Technologies) e o paradigma CASA (Computers as Social Actors) reforçam essa visão: os usuários tendem a aplicar heurísticas sociais a computadores que exibem características humanas.
Historicamente, os computadores eram vistos apenas como ferramentas técnicas caixas de processamento sem agência. Máquinas como o ENIAC não se comunicavam com o usuário de forma simbólica ou emocional. Hoje, porém, sistemas são projetados para conversar, interagir e até provocar reações, seja por meio de mensagens simpáticas como “Segure firme, estamos quase lá!” ou por micro-interações.
Se computadores podem evocar atributos humanos, então também podem utilizar recursos sociais como humor, elogio e simpatia. Esses elementos não são meramente decorativos, mas instrumentos estratégicos de design para construir vínculos, reduzir a fricção da interação e incentivar o engajamento. Ainda assim, é essencial refletir sobre os limites éticos desse uso: elogios automatizados podem ser percebidos como manipuladores ou condescendentes, especialmente em contextos culturais diversos. O impacto de tais mensagens depende do contexto, da linguagem usada e das expectativas sociais dos usuários.
Assim, é necessário um olhar crítico sobre o uso de flattery em sistemas interativos. A bajulação pode ser uma ponte emocional, mas também um ruído, dependendo de como e onde é aplicada. Cabe ao design consciente equilibrar autenticidade, funcionalidade e sensibilidade cultural para evitar que o que era para ser cativante se torne artificial ou ofensivo.
Empatia com as máquinas
Considerando o argumento anterior, isso mostra que usuários não apenas toleram, mas muitas vezes respondem com empatia e respeito às máquinas, sobretudo quando estas demonstram traços sociais. Já ouvi histórias de pessoas dizendo “por favor” ou “obrigado” ao ChatGPT, um comportamento que ilustra como as heurísticas sociais são automaticamente aplicadas mesmo em interações com entidades não humanas.
Um artigo recente de pesquisadores da Microsoft sugere que modelos de IA generativa, como o próprio ChatGPT, apresentam melhores resultados quando os usuários os tratam como humanos. Isso indica que a forma como o usuário se comporta diante do sistema influencia diretamente a resposta recebida; criando um ciclo de socialização tecnológica.
Inspirado por essas ideias e pela literatura sobre flattery e captologia, comecei a experimentar esse tipo de abordagem em um formulário de um produto que estou desenvolvendo. A interface foi projetada para oferecer feedbacks positivos sutis durante a navegação, utilizando frases amigáveis e encorajadoras. Os feedbacks dos usuários foram positivos, não esperava, veja a imagem abaixo.
Quando você escreve seu nome, a interface responde com “Prazer é meu”. Ao inserir o e-mail, ela diz “Massa!”, e, por fim, ao digitar a senha, aparece a mensagem “Humm, achei seguro.” Esses pequenos recursos comunicativos tornam a interface não apenas eficaz, mas também ajudam a criar uma conexão emocional com o usuário, reforçando a sensação de acolhimento e reconhecimento durante a interação.
Essa experiência reforça a ideia de que pequenos toques de humanidade como elogios, empatia ou até mesmo uma leve brincadeira têm poder de transformar interações funcionais em experiências emocionalmente memoráveis. Personalizações simples, quando bem aplicadas, encantam e reforçam a percepção de cuidado por parte do sistema.
Elogios funcionam e eu posso provar
Continuei usando a mesma abordagem de elogio “flattery” na Interface de Upload da plataforma. Durante os testes, os usuários relataram sentir-se bem ao submeter seus trabalhos. Embora o sistema ainda esteja em fase de concepção, isso demonstra o potencial do design para encantar e envolver.
No software TunnelBear, o uso do “flattery” também é notável, com mensagens de despedida que utilizam bajulação e apelos emocionais para desencorajar o usuário. Como pode ver na imagem abaixo, a mensagem “Uninstall your bear?” junto com a ilustração de um urso com expressão triste é uma forma sutil de apelo emocional que o software usa para persuadir o usuário a cancelar a desinstalação.
A pessoa que postou essas imagens acima no Reddit escreveu o seguinte:
Nunca me senti tão culpado ao desinstalar um programa.
A maneira como o Flattery é aplicado no TunnelBear é uma forma de manipulação psicológica sutil na interface do usuário, a fim de tentar impedir que o usuário realize a desinstalação do software, mesmo que essa ação possa ser a melhor opção para ele.
Explorei esse conceito de maneira ética no projeto de um aplicativo de treino que desenvolvi. Pense nisso como se você estivesse diante de um coach. Qual é o papel de um coach senão motivar, inspirar, elevar o astral do atleta? Quando ele grita “Vai, você consegue!” ou “Você tem força de leão!”, não está falando literalmente, está usando recursos linguísticos para provocar um impulso emocional. No meu projeto, fiz o mesmo. Os elogios foram incorporados como estratégias motivacionais contextuais, surgindo apenas em momentos de celebração, como após a conclusão de uma etapa ou meta.
A ideia não foi bajular o usuário indiscriminadamente, mas reforçar conquistas específicas.
Essas mensagens positivas estão fundamentadas em abordagens como o reforço comportamental (Skinner, 1957), teorias contemporâneas de motivação autodeterminada (Deci & Ryan, 1985) e nos efeitos de valorização interna das ações (Deci & Ryan, 1970).
Ao receber esse tipo de resposta positiva, o usuário tende a associar a ação concluída a sentimentos como realização, competência e orgulho, o que aumenta a probabilidade de repetição e engajamento futuro.
O que a ciência diz sobre flattery em UI
Em um estudo de BJ Fogg e Clifford Nass (1997), foi demonstrado que “os efeitos da bajulação por parte do computador foram fortes e abrangentes” (p. 556). A bajulação teve um impacto claro sobre a forma como os usuários se percebiam, especialmente em comparação com feedbacks genéricos. Assim como a psicologia social aponta que elogios exagerados podem ter efeitos positivos na interação humano-humano, o estudo de Fogg e Nass confirmou que esse mesmo efeito pode ser alcançado na interação entre humanos e computadores.
No entanto, é essencial fazer uma distinção entre empatia genuína e manipulação. Esse tipo de abordagem pode ser considerado uma prática problemática de design de interface quando usado para mascarar deficiências do sistema ou conduzir o usuário a comportamentos desejados pela empresa, e não por ele. Isso fere princípios éticos do design centrado no usuário.
Não recomendo que esse tipo de prática seja aplicado indiscriminadamente em produtos. O flattery pode ser eficaz, sim, mas deve ser usado com propósito, transparência e respeito à autonomia do usuário.
Flattery ‘bajulação’ na Interacão-Humano Tecnologia was originally published in UX Collective