Seis shows da Virada Cultural 2025: Tom Zé, Kid Creole, Pato Fu, Karnak, Fin del Mundo e Tributo à Rita e Roberto

Em seu aniversário de 20 anos, a Virada Cultural de São Paulo promoveu shows em 16 grandes palcos nos bairros e cinco na região central, além de eventos no Sesc e CCSP, entre outros

May 29, 2025 - 07:25
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Seis shows da Virada Cultural 2025: Tom Zé, Kid Creole, Pato Fu, Karnak, Fin del Mundo e Tributo à Rita e Roberto

Em seu aniversário de 20 anos, a Virada Cultural de São Paulo promoveu shows em 16 grandes palcos nos bairros e cinco na região central, além de eventos em palcos menores e em instituições como Sesc e Centro Cultural São Paulo, entre outros. A sensação é de que, após anos apagada, a Virada teve brilho renovado em 2025 (inclusive na questão de segurança), e se o Scream & Yell fala de apenas seis shows abaixo, isso só acontece porque o evento rolou no mesmo fim de semana do C6 Fest, um festival repleto de grandes shows, mas não queríamos ficar de fora: valorizamos a Virada Cultural, e queremos ela potente, segura e repleta de shows especiais. Que venha 2026. Antes, nossos seis shows:


Tom Zé no Centro Cultural São Paulo, 19h do sábado
texto por Leandro Luz / Foto de Fátima Albacete

Tom Zé pisou diante do seu público no CCSP pontualmente às 19h, como anunciado pela programação da Virada Cultural. Três horas antes, uma fila gigantesca se formava na bilheteria e passava dos limites da área externa do centro cultural, composta por gente de todas as idades ansiosa pelo retorno do “último tropicalista”, há quase um ano afastado dos palcos devido a um acidente doméstico sofrido em agosto de 2024. Para quem já teve o privilégio de presenciar algum show do artista baiano nos últimos 15 anos, não houve grandes surpresas no roteiro para além do milagre que é estar diante de um gênio de 88 anos de idade em plena forma e lucidez. Em termos de repertório, foram mostradas 15 músicas, se contarmos o bis com “Parque Industrial”, a habitual e sempre divertida “Jingle do Disco” e uma improvisada versão para “O Riso e a Faca”, canção que abriu o show, precedida por um eufórico discurso em celebração ao prêmio vencido pela atriz Cleo Diára no Festival de Cannes pelo filme homônimo dirigido pelo português Pedro Pinho (uma coprodução brasileira). O que causou surpresa para alguns (apesar desta não ter sido a primeira vez) foi a ausência de Jarbas Mariz, fiel escudeiro que serviu ao cantor e compositor como uma âncora por mais de 30 anos, conduzindo todos os shows como um verdadeiro maestro. O músico e seu bandolim fazem falta, mas a performance da banda, por outro lado, segue firme, forte e coesa com o guitarrista Daniel Maia assumindo o espaço deixado por Jarbas. Aliada a ele, Andrea Dias também ocupa um papel importante nos vocais, discreta e luminosa fazendo a cama para que Tom Zé possa passear pelas brilhantes melodias e ideias que inventou ao longo de praticamente seis décadas. Se os seus colegas de geração vem se apresentando em shows grandiloquentes em arenas e estádios, Tom Zé faz seu berço na viração: em cerca de uma hora de apresentação ele cantou, dançou e se ajoelhou (!) para reverenciar as centenas de pessoas em êxtase que lotaram a sala Adoniran Barbosa exclusivamente para lhe ver. A sua força é descomunal, assim como é linda a sua capacidade de emocionar. Como poucos, com a sua música, o seu intelecto e o seu corpo, Tom Zé percorre com destreza o caminho que vai direto do cérebro ao coração.


Kid Creole and the Coconuts na Praça da República, 22h30 do sábado
texto por André Fiori / Foto de Will Santos

August Darnell começou a carreira ainda nos anos 1970 na cena ‘disco’, mas se reinventou na década seguinte como Kid Creole (‘stage name’ inspirado num filme de Elvis Presley: ‘King Creole’ de 1958) and The Coconuts (sempre com três cantoras). Conta a lenda que eles foram a inspiração para Julio Barroso, que passando temporada em Nova York no início dos anos 1980, foi a um show deles e teve um ‘click’. Voltando ao Brasil cheio de ideias, Julio criou a Gang 90, e as Coconuts viraram As Absurdettes. Você sabe, caro leitor: existem dois tipos de shows: aquele que você vai porque já sabe exatamente o que vai encontrar / ver / ouvir. E aquele aonde você, mesmo conhecendo o artista, está totalmente aberto a surpresas, vai e se joga. Quando a surpresa é positiva, a sensação é mágica, como neste caso. Só mesmo um evento assim, ou festival, para escalar uma atração fora da mídia com banda completa, 11 músicos no palco: baterista, guitarrista, tecladista, naipe de metais e cantoras. Se dependesse da bilheteria, esse show nunca iria se pagar, ainda que August/Kid valha o investimento. Ele é um showman, um entertainer na tradição das big bands, do show business americano, e é isso o que ele entrega aqui. Totalmente ‘na estica’ e já com 74 anos, August é uma figuraça. Em cena, fica óbvia a inspiração em James Brown. Sua banda manda ver um funk vigoroso com tempero latino / caribenho e jeito de orquestra de Cab Calloway. No set, suas canções mais conhecidas bateram ponto: “Annie I’m Not Your Daddy”, “I’m a Wonderful Thing, Baby” e “Stool Pigeon”. Porém, houve espaço também para covers de Frank Sinatra e Big Joe Turner, e as meninas fizeram um medley de Beatles. Ah sim, as meninas. O que dizer das três novas Coconuts que não vá parecer exagero? Com toda certeza não eram nascidas na época em que o Julio Barroso assistiu ao show de Kid Creole em NYC… São duas holandesas e uma norte-americana, lindas, que cantam demais e dançam muito (o pacote completo da profissão). E Kid Creole dá espaço para que elas brilhem: além dos backing vocals, elas têm momentos próprios à frente do palco. O som do palco República estava ótimo, e o público sacolejou o tempo inteiro com direito a bis e sorriso no rosto.


Pato Fu no Sesc Pompeia, 23h30 do sábado
texto de Marcelo Costa / Foto de Bruno Capelas

O tempo, tempo, tempo, mano velho parece não passar para o Pato Fu. Circulando com sua turnê comemorativa de 30 anos (33 em 2025), a banda mineira segue impecável ao vivo, e o público que esgotou os cerca de 800 ingressos da Comedoria do Sesc Pompeia – um dos lugares mais bacanas para se ver shows na capital paulista – para uma apresentação que começaria às 23h30 e terminaria à 1h da manhã do domingo, pode conferir mais uma vez como Fernanda, John, Ricardo, Xande e Richard não só seguem afiados no palco como estão tão à vontade que só falta um bule de café e um punhado de pão de queijo circulando pelo ambiente. “Spoc”, presente na lendária “Pato Fu Demo” (exibida por um fã no show), deu o start seguida de “Sobre o Tempo”, “Água” e “Antes Que Seja Tarde”, para delírio de todos. O impagável sambinha realista “Tribunal de Causas Realmente Pequenas” surgiu quase improvisado. Já a porrada “Licitação”, um dos grandes momentos de John Ulhoa nessa turnê, atropela a todos. Fernanda apresenta Richard Neves, que brilha em “Eu”, cover clássico da Graforreia Xilarmônica. John, então, fala da canção mais besta da banda, a genial “Vida Imbecil”, e também da mais mineira, “Simplicidade”. Do disco mais recente de inéditas, “30”, de 2023, a balada emocional “Fique Onde Eu Possa Te Ver” faz brotar lágrimas, mas eles fariam todos sorrir e cantar “Qualquer Bobagem”, “Perdendo Dentes” e “Capetão 66.6 FM”. Para o bis, Fernanda pede a John: “Diz, ‘sim senhora’”. Ele repete a frase e solta o riff poderoso de “O filho predileto do Rajneesh”. O hino patofuniano “Rotomusic de Liquidificapum” manda todo mundo para casa sorrindo. Faltou “Agridoce”, “Mamãe Ama Meu Revólver”, “Imperfeito”, “Um Dia, Um Ladrão”, “Me Explica”, a música da Unimed, massssss quem sabe num próximo encontro, não é mesmo. Que não demore.


Karnak no Centro Cultural São Paulo, 1h da manhã do sábado
texto de Marcelo Costa / Fotos de Bruno Capelas

Uma das sequencias mais bacanas da Virada Cultural 2025 era “quase tudo o que sonhei”: Pato Fu seguido de Karnak. As duas bandas são “irmãs de pensamento livre em relação à música” (definição da própria Fernanda Takai aqui no Scream & Yell), com André Abujamra tendo produzido os Fus (em “Tem Mas Acabou”, de 1996), e Fernanda, John, Xande e Koctus participando de “Universo Umbigo”, de 1997 (na canção “Rapaz Eu Vi”). O “quase” é porque o show dos Fus precisaria ter começado meia hora antes para que o deslocamento Pompeia / Vergueiro permitisse assistir ao Karnak desde o começo. Porém, vendo o esforço da equipe, os santos colaboraram: houve um pequeno atraso no CCSP e, devido ao cancelamento de Chico Chico, que faria o show das 4h, o Karnak pode esticar sua apresentação. Dessa forma, o bom público que chegou cedo e lotou a parte inferior de outra sala mítica de São Paulo, a Adoniran Barbosa, pode conferir as três faixas de abertura do set, “Universo Umbigo”, “Comendo Uva na Chuva” e a sensacional “Drumonda” (doeu perder essa). A partir de “Lee o Dua”, porém, e sentados no chão à beira do palco e de frente para Abu, foi possível presenciar mais uma apresentação arrebatadora dos 11 integrantes do Karnak – incluindo duas baterias – tocando as canções do álbum listado como um dos 20 melhores discos latinos de rock de todos os tempos pela Rolling Stone USA. Vários hinos do disquinho marcaram presença (“Balança a Pança”, “O Mundo” com participação de Paulinho Moska, “Ai, Ai, Ai, Ai, Ai, Ai, AI” e, claro, o hit “Alma Não Tem Cor”, como sempre, desconstruído) com André nem um pouco preocupado com a madrugada querendo virar manhã. A todo momento ele puxava história, a banda engatava piada e o público gargalhava. “Juvenar” surgiu encantadoramente bela, houve um inenarrável “encontro de fitas k7” (depois expostas no saguão do CCSP) e, ainda, uma versão de mais de 20 minutos de “Eu Tô Voando”, que nem presente no set list estava. Naquele exato momento estávamos todos sonhando…


Fin del Mundo na Pista Antônio Prado, 14h do domingo
texto e fotos por Bruno Capelas

Se for preciso provar o quanto uma banda pode evoluir no palco em apenas um ano, as argentinas do Fin del Mundo são uma das melhores amostras disponíveis. Em sua terceira passagem pelo Brasil em 14 meses, com direito a show de antevéspera no brasiliense Porão do Rock, o grupo da Patagônia segue crescendo a olhos vistos e sabendo lidar com as adversidades que cada ribalta lhes impõe. No caso da Virada Cultural, a principal dificuldade foi o atraso acumulado: o show anterior, uma balançada exibição do congolês Yannick Delass, teve seu início retardado em mais de uma hora. A demora fez as hermanas terem de passar o som diante de um público não só impaciente, mas propenso a deixar o espaço em busca de outra opção na programação. Quem esperou 45 minutos, porém, foi brindado não só com um som potente e alto (como reza a cartilha shoegaze), mas também com uma banda cada vez mais forte, pronta para dominar a plateia com muralhas de guitarras ou com um carismático sotaque em português. Assim como em setembro último, quando fizeram um dos mais elogiados shows do Se Rasgum, o grupo passeou com delicadeza e destreza pelo repertório de seus dois discos, fazendo execuções apaixonadas de canções como “Vivimos Lejos”, “Cuando Todo Termine”, “Una Temporada en El Invierno” e o já clássico coro de “El Próximo Verano”, sempre a postos para arrancar um sorriso do rosto dos presentes. Não se engane, leitor: elas vêm do fim do mundo, mas vão conquistá-lo por inteiro – um show de cada vez.


Tributo à Rita e Roberto na Praça da República, 18h, domingo
texto por André Fiori / Foto: Reprodução – Instagram de Paulo Miklos

Nos últimos tempos têm rolado muitos tributos à Rita Lee. Ela merece todos, e ainda há espaço para mais. Este foi montado especialmente para a Virada Cultural 2025, encerrando o evento no palco República com quatro intérpretes. Na ordem de apresentação: Fernanda Abreu, Johnny Hooker, Gaby Melim e Paulo Miklos. Existem duas óticas para se analisar este show: 1) A ótica do público: todo mundo dançou, todo mundo cantou, portanto neste aspecto a noitada foi um sucesso; 2) Uma ótica mais exigente (para não dizermos “a do chato”) e crítica: a banda era correta, mas os arranjos muitas vezes sugeriam uma levada mezzo ‘disco’ / mezzo marchinha de carnaval. Tocar músicas que estão enraizadas nas nossas lembranças e no consciente coletivo tem o lado bom que todo mundo canta junto, mas também se sente falta daqueles detalhes saborosos das versões originais, não tem como fugir. Cada intérprete cantou três hits: Fernanda Abreu abriu com “Saúde” dando início ao baile, e ela sabe muito bem como ‘animar o baile’. Quem ‘costurava’ o show entre uma apresentação e outra era o apresentador Edgard Piccoli, que logo depois chamou Johnny Hooker que dentre outras trouxe “Doce Vampiro”. Na sequência, a cantora do grupo Melim, que agora está solo, Gaby, era a “caçula” da turma. Ela ganhou pontos ao surgir com “Coisas da Vida”, mas jogou tudo por terra … “coroando” seu desempenho por não saber a letra desta que, com certeza, está no ‘top 3’ de canções da Rita (e era uma das favoritas da própria da autora). Errar uma letra é um pecado, ainda mais esta… e isso fez com que o interesse fosse caindo. Logo depois veio o ‘peso pesado’ da noite: Paulo Miklos foi do romance (“Mania de Você”) ao rock (“Papai Me Empresta o Carro”). No final todos voltaram ao palco pra encerrar a festa com “Lança Perfume”, mas, no geral, o tributo “Um Caso Sério” soou bem morno…


Leia também:
– Virada 2007: Paulinho da Viola, Maria Alcina, Garotos Podres, João Donato e Jards Macalé (aqui)
– Virada 2008: Luiz Melodia, Vanguart, Tom Zé, Ultraje a Rigor, Do Amor, Orquestra Imperial (aqui)
– Virada 2009: Wando, Odair José, Los Sebozos Postiços, Zeca Baleiro, Tutti Frutti (aqui)
– Virada 2010: Céu, Tulipa Ruiz, Raimundos, Camarones Orquestra Guitarristica, Tulipa Ruiz (aqui)
– Virada 2012: Dalto, Man Or Astro-Man, Defalla, Titãs, Pinduca (aqui)
– Virada 2014: Ira!, Juçara Marçal, Falcão, Pepeu Gomes, Riachão, Rosanah, Otto (aqui)
– Virada 2015: Loomer, Wry, Paralamas, Eduardo Dussek, Johnny Marr (aqui)
– Virada 2019: Marina Lima convida Letrux, Deize Tigrona, Grande Encontro, Maria Beraldo (aqui)