Especial: Dois meses depois, 9 bandas ainda ecoam o SXSW 2025

O estúdio/produtora Submarino Fantástico foi uma das 10 empresas selecionadas pelo programa Creative SP para representar o Governo de São Paulo na SP House durante o South by Southwest 2025.

Jun 4, 2025 - 20:55
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Especial: Dois meses depois, 9 bandas ainda ecoam o SXSW 2025

por Otávio Carvalho

Tem aquele velho clichê: “mais importante que viajar é a viagem”.

Neste ano, o estúdio/produtora Submarino Fantástico foi uma das 10 empresas selecionadas pelo programa Creative SP para representar o Governo de São Paulo na SP House durante o South by Southwest 2025.

Entre reuniões, encontros e apresentações da nossa produtora de áudio, o festival foi uma explosão de novas possibilidades sonoras, palestras instigantes e performances memoráveis.

Trabalhar com som significa viver em constante pesquisa, e um ambiente como esse é como tentar apagar incêndio com gasolina. A mente retorna fervilhando, repleta de anotações sobre setups, impressões e ideias para aplicar na produtora.

Agora, dois meses depois, compartilho nove bandas que assisti ao vivo e, por diversos motivos, ainda ecoam forte na minha cabeça.

Nota do editor: os registros em vídeo, em sua maioria, não são do SXSW, mas auxiliam na imersão.


01) Echo Collective: Uma experiência sonora imersiva
Na Central Presbyterian Church, o Echo Collective, duo belga formado por Neil Leiter e Margaret Hermant, apresentou uma performance inesquecível. A configuração instrumental era intrigante: dois violinos, com Hermant também tocando piano e harpa. O diferencial estava nos processamentos sonoros realizados por um terceiro integrante, que manipulava os sons em tempo real, criando uma atmosfera sonora imersiva e multidimensional. A utilização da tecnologia 4DSound ampliava a espacialidade do som, fazendo com que a música transcendesse as limitações físicas do espaço. O ambiente da igreja, com sua acústica reverberante e atmosfera contemplativa, potencializou a experiência, tornando-a quase transcendental. A harpa, processada por pedais, produzia graves profundos e texturas ricas, transformando a percepção auditiva do público.


02) Alix Fernz: O punk renovado
Em uma noite intensa no Swan Dive, assistimos ao showcase do Pop Montreal. Alix Fernz (Alexandre “Spazz” Fournier) subiu ao palco externo entregando uma performance visceral que mesclava a crueza do punk original com texturas modernas. Sua performance foi marcada por vocais processados com delays e distorções, além de uma presença de palco intensa, chegando a colocar o microfone dentro da boca. A banda que o acompanhava também contribuía para essa sonoridade híbrida: o guitarrista utilizava teclados, o baterista incorporava pads eletrônicos e o baixista explorava uma variedade de pedais. Essa combinação resultava em um som que honrava as raízes do punk, mas soava absolutamente contemporâneo.


03) Population II: Sonoridades e estratégia de guerrilha
Na mesma noite da apresentação de Alix Fernz, o trio montrealense Population II foi outra surpresa. O que inicialmente impactou foi a riqueza sonora — uma verdadeira montanha que se estendia desde picos intensos e agressivos até vales repletos de nuances melódicas e harmônicas. Durante o show, percebi o quão bem trabalhada era a dinâmica do trio. O baterista não apenas conduzia o ritmo com extrema potência, mas também modulava sua voz com um slap delay para criar texturas que dialogavam com a sonoridade vocal do disco da banda. O guitarrista, por sua vez, demonstrava versatilidade ao integrar toques de teclado e um dispositivo peculiar — um osciloscópio gerador de sinais de ruído processados com delays e efeitos —, enquanto o baixista explorava diferentes timbres utilizando um baixo de oito cordas (com quatro pares de cordas duplas), ampliando o espectro sonoro. Após o espetáculo, consultei a agenda da banda e descobri que eles estavam se apresentando em diversos locais ao longo do festival. Curiosamente, em dias em que não havia shows em palcos tradicionais, eles se apresentavam em hotéis e outros espaços alternativos. Esse ritmo — praticamente um show por dia — me fez refletir sobre a importância de manter uma agenda bem articulada durante um festival. A capacidade de amarrar compromissos em diferentes locais, muitas vezes com parcerias estratégicas, garante à banda valorizar ainda mais o investimento e o deslocamento até o evento.


04) Chris Lanzon: Criando camadas para conduzir o público
Entre os espaços mais silenciosos do festival, fui ao St. David’s Historic Sanctuary assistir ao show de Chris Lanzon. Sozinho no palco durante a maior parte do tempo, ele usava apenas um violão, alguns pedais de efeito e sua voz – mas foi o suficiente para criar uma atmosfera densa e envolvente. Lanzon, australiano, tem uma voz linda, mas o que chamou atenção foi a forma como ele construía o ambiente ao redor dela. Com camadas de efeitos criados ao vivo, ele deixava pairar uma espécie de névoa sonora no fundo, enquanto um stomp box — clássico pedal de bumbo do folk — acionado com o pé, projetava graves, que conduziam as sensações do público de forma quase inconsciente. Houve uma breve participação de uma pianista, o que trouxe ainda mais profundidade a uma apresentação já bastante sensível. Tudo ali parecia ter intenção: os silêncios, o som que surgia lentamente, a dinâmica que alternava entre intimidade e expansão.


05) Jacob Alon: Minimalismo emocional
Na mesma noite em que assisti à apresentação de Chris Lanzon no St. David’s Historic Sanctuary, fui surpreendido por Jacob Alon, artista escocês que se apresentou no mesmo local, em 14 de março, das 22h às 22h40. Enquanto Lanzon utilizava pedais e texturas para construir sua atmosfera sonora, Alon optou por uma abordagem mais minimalista, confiando na força de suas composições e na expressividade de sua voz. Alon subiu ao palco com dois violões, cada um com afinações distintas — uma mais grave e outra reminiscente das utilizadas por Nick Drake. Sua voz aguda contrastava com os tons profundos dos instrumentos, criando uma dinâmica envolvente que capturou a atenção do público. Sem recorrer a efeitos ou acompanhamentos elaborados, ele conduziu a plateia por meio de suas melodias e harmonias cuidadosamente elaboradas.


06) Paris Death Hilton: Punk eletrônico japonês em estado bruto
Próximo ao Austin Convention Center, fomos atraídos pela Paris Death Hilton, duo japonês formado por Kuba (eletrônicos) e Ken Takahashi (bateria). O que mais impressionou foi a forma como Kuba manipulava os pads eletrônicos e controladores MIDI, como quem manipula um instrumento convencional, criando camadas sonoras complexas e uma digitação virtuosa. Takahashi, por sua vez, comandava a bateria controlando seus próprios processamentos no instrumento, complementando os sintetizadores distorcidos e os ritmos quebrados. A dupla opta por não utilizar sincronização por clique, preferindo uma abordagem mais orgânica e física em suas performances. A configuração de som também foge do convencional: os teclados e sintetizadores são conectados diretamente a amplificadores de grave e agudo, criando uma parede sonora. As composições instrumentais, muitas vezes em compassos compostos, desafiaram as expectativas e mergulharam o público em uma experiência sonora extremamente física e incrédula.


07) Carpetman: Uma imersão sonoro-físico-visual
Logo após, no Las Perlas, Carpetman trouxe uma performance marcante, vestido completamente de tapete. Carpetman, artista ucraniano, é conhecido por sua identidade misteriosa e por performances que mesclam blues, soul e elementos eletrônicos. Confesso que estava um tanto incomodado, pensando a cada pausa sobre ele e todo aquele aparato. Porém, sua voz, com um falsete marcante, deslizava por melodias emotivas, enquanto bases eletrônicas suaves sustentavam a estrutura musical. O traje de tapete, além de peculiar, contribui para a imersividade do show, fazendo com que o público se questione sobre a figura por trás da música. Carpetman cria seu próprio universo sensorial, combinando visual e sonoridade de maneira impactante.


08) Shelby Ruger: Me dê duas músicas
Shelby Ruger começou sua apresentação no Swan Dive com certo desconforto e ritmo hesitante. A banda, composta por baixo, guitarra, teclado e voz apresentava uma sonoridade que demorava a fluir, com uma sensação de que o tempo não estava tão ajustado quanto o estilo pedia. Mas de repente fomos surpreendidos com a chegada do baterista no meio do show, o que transformou completamente a dinâmica da apresentação. Com ele, a banda ganhou pulsação, liberdade e uma nova energia. O baixista, que até então sustentava — com dificuldades — o “chão” da banda, pôde explorar mais musicalmente, e o grupo passou a respirar junto. As duas músicas finais foram suficientes para revelar o verdadeiro potencial da artista e de sua banda, criando uma atmosfera vibrante e cheia de groove. A reação do baterista ao final — mãos na cabeça, curvado sobre a caixa — parecia um lamento. Mas bastaram dois momentos completos de som, para ficar claro o quão forte é a química entre os integrantes.


09) DAP The Contract: Bela surpresa na programação paralela
Fora da programação oficial, o rapper nigeriano radicado em Nova York, DAP The Contract encerrou minha experiência em Austin com uma performance contagiante no South by San José, um evento aberto promovido por um hotel, que aproveita o movimento da cidade para fazer seu próprio evento. Acompanhado por um DJ e um trio de metais, DAP entregou um show que mesclava hip-hop e soul com canções pra cima, criando uma atmosfera impossível de resistir. Sua presença de palco era magnética: em determinado momento, subiu nas caixas de som; em outro, desceu até a plateia, interagindo diretamente com o público, seguido pelos músicos de sopro. A sinergia entre os artistas e a audiência era palpável, transformando o espaço em uma verdadeira celebração.

Pois é… meses depois, percebo que, mais importante que o destino é realmente degustar o caminho e trazer consigo o que te fez sair do lugar.

– Otávio Carvalho, o Ota, é engenheiro de som, músico multi-instrumentista, compositor, produtor musical e de trilha sonora, atuando há 24 anos no mercado audiovisual. Atualmente é sócio do estúdio/produtora Submarino Fantástico, onde produz áudio para TV e VOD/streaming (Netflix, Discovery Kids, HBO, Cartoon Network, entre outros) e discos (André Abujamra, Vitrola Sintética, Trupe Chá de Boldo, rapper Xis, Maglore, Josyara, Alzira E, Virgínia Rodrigues, entre outros). Também é um dos fundadores do selo Pequeno Imprevisto, que além de discos também cria conteúdo sobre música. Os artistas do selo no momento são a banda franco-brasileira Čao Laru, Bruna Lucchesi, Gustavo Galo, Luizga (Luiz Gabriel Lopes), Barbara Rodrix, Helô Ribeiro e mais. Como músico integra as bandas Vitrola Sintética e Čao Laru, além de acompanhar os cantores Paulo Miklos e Gustavo Galo, quase sempre como baixista. Com o Vitrola Sintética recebeu 3 indicações ao Grammy Latino, entre 2015 e 2016, como artista, compositor, engenheiro de gravação e mixagem.