Entrevista: Tagua Tagua traz disco dançante e parceria com White Denim em “Raio”

Gravado em casa, "Raio” nasceu de forma espontânea num ambiente de liberdade criativa. Quando percebeu, Felipe estava imerso num universo pop e ensolarado.

Jun 9, 2025 - 05:55
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Entrevista: Tagua Tagua traz disco dançante e parceria com White Denim em “Raio”

entrevista de Alexandre Lopes

O Tagua Tagua, projeto solo do cantor, compositor e produtor Felipe Puperi, entra numa nova fase com “Raio” (2025), seu segundo álbum de estúdio. Lançado em maio, o disco mantém o cuidado estético que marcou seus trabalhos anteriores, mas agora canaliza essa intensidade de forma diferente: é um trabalho mais ritmado, acelerado e dançante. Com ele, Puperi abre espaço para o groove, deixa a psicodelia em segundo plano e assume de vez o desejo de colocar os fãs para se mexerem na pista. “Eu já vinha tendo essa vontade de ter um pouco desse ritmo, dessa pegada mais ‘para cima’. O show tem momentos eletrizantes, mas sempre mais dentro do rock psicodélico, e não tanto nessa coisa do beat com groove, trazendo essa coisa mais dançante e energizante. Então quis mergulhar nisso”, conta Felipe.

Um dos destaques do disco é a parceria com a banda norte-americana White Denim, na faixa “Lado a Lado”. A colaboração nasceu depois de uma série de mensagens com o músico James Petralli pelo Instagram. Depois de trocarem ideias sobre gostos musicais em comum, Felipe mandou uma demo, James curtiu, gravou guitarras, sopros, percussões, e a faixa cresceu. “Faltava a mão desse cara nessa música”, diz. Segundo Felipe, é uma união improvável que deu certo e os mundos musicais diferentes, mas que se conversam. E essa parceria também se estenderá em breve para uma turnê conjunta no exterior, com 18 shows em 19 dias em julho.

Gravado em home studio, “Raio” nasceu de forma espontânea num ambiente de liberdade criativa a partir das primeiras batidas. Quando percebeu, Felipe estava imerso num universo mais pop e ensolarado. Mas mesmo com essa virada mais acessível, Felipe acredita que fazer música é ousar e fazer ruído também. Neste sentido, ele critica o padrão radiofônico brasileiro de vocais excessivamente claros. “Acho que aqui a gente tem uma restrição muito grande em relação à estética sonora e do mercado nacional de que a voz tem que ser uma coisa na frente, com mensagens muito claras, limpa e sem efeitos. E eu não vejo voz assim dentro de uma música, sabe? Vejo a voz como um instrumento fazendo melodias e com efeitos. Muitas vezes eles estão ali justamente para causar uma sensação com o resto da música”, pontua.

Para ele, mais do que seguir cartilhas ou receitas pré-definidas para ‘dar certo’ como um músico independente, o caminho mais indicado seria descobrir a própria bússola no meio musical. “Cada um constrói a sua história e o seu caminho da sua forma. E essa narrativa não se repete, por mais que siga os mesmos passos que eu, você vai chegar em resultados diferentes.” Em um papo com o Scream & Yell, Felipe contou mais sobre o processo de criação de “Raio”, os planos do Tagua Tagua, e sua percepção ao tocar fora do país. E ao que tudo indica, ele ainda tem muita energia guardada para buscar novos resultados. Confira o papo completo abaixo.

 

Você gravou o disco em casa? Como foi esse processo?
Sim, eu gravei em casa. Na verdade é uma prática meio usual para mim, porque tenho estúdio caseiro desde minha antiga banda, Wannabe Jalva, mais ou menos por 2016, quando eu ainda morava em Porto Alegre. Quando me mudei para São Paulo em 2017, morei por 4 ou 5 anos em uma casa que tinha um estúdio maior e mais elaborado na garagem, onde gravei meu primeiro álbum. Sempre trabalhei com produção, sempre tive esse canto de ‘self produção’, uma coisa meio independente dos outros. Ficou muito evidente para mim que esse era o meu processo, de criar as coisas no meu próprio espaço e no meu próprio tempo. Acho que isso veio muito de um processo contrário à forma de produzir sob pressão dentro de um estúdio, com hora correndo e preocupado em como resolver as coisas. Daí hoje em dia, quando preciso gravar alguma coisa bem específica, como uma bateria, um naipe de sopro, um arranjo de cordas, tenho vários amigos com parcerias em estúdios aqui em São Paulo. Mas eu acabei gravando, montando e desenvolvendo tudo na minha casa mesmo.

“Raio” tem uma sonoridade bem mais dançante e menos psicodélica do que os trabalhos anteriores. Essa foi uma escolha deliberada sua ou as músicas simplesmente foram surgindo assim, de forma espontânea?
Na criação tive vontade de fazer batidas e andamentos um pouco mais acelerados, mas de uma forma um pouco mais espontânea. Aí depois, quando tinha criado duas ou três músicas do álbum, comecei a entender que queria ir por esse caminho, fui me permitindo mergulhar em caminhos cada vez mais dançantes. Mas parei de me preocupar com isso, de tentar me guiar por um norte, e mergulhar nisso. Acho que essa coisa mais natural surgiu nas primeiras músicas, veio um pouco da minha vontade de ter isso nos shows. Eu já vinha tendo essa vontade de ter um pouco desse ritmo, dessa pegada mais ‘para cima’. O show tem momentos eletrizantes, mas sempre mais dentro do rock psicodélico, e não tanto nessa coisa do beat com groove, trazendo essa coisa mais dançante e energizante. Então quis mergulhar nisso na feitura do álbum, no meio dele. Acho que foi na música “Let it Go”, o segundo single, que surgiu e entendi que tinha que ser nessa levada. Aquela música pedia isso, realmente mergulhar e assumir essa frente um pouco mais dançante do álbum. E eu acho muito interessante mudar também, não tenho muito interesse em fazer sempre as mesmas coisas e repetindo fórmula. Pra mim, cada álbum é um mergulho, um recorte de onde o artista está, de como ele está vendo e sentindo o mundo. E para mim, esse momento era uma coisa ‘solar’.

Li umas entrevistas antigas suas e parece que ao vivo você deu uma acelerada em algumas músicas de um disco anterior. Você acha que vai ter que adaptar de alguma forma o repertório desse disco novo pro formato ao vivo?
Eu acho que não. A gente inclusive foi tocar uma delas, a “Lado a Lado”, que era primeiro single, a música com o White Denim. Ela já naturalmente é um pouco mais rock, apesar de ter um refrão que também te estimula a dançar. Ela é feita de uma forma diferente, principalmente no beat da bateria. Acho que até no baixo ela é menos groovada, um pouco menos dançante nesse aspecto. A gente teve a possibilidade de tocar ela ao vivo no Lollapalooza esse ano e ali a gente já percebeu que a música é rápida, foi feita com esse caráter, então a gente não teve que mudar isso. A gente gravou uma session ao vivo que saiu junto com o álbum agora, e quando a gente foi tocar “Artificial”, percebemos que ela também é rápida, num sentido bem diferente do “Tanto”, meu disco anterior, que é mais lento. Hoje em dia eu vou ouvir e me dá vontade de acelerar, porque a gente foi tocá-la e se acostumou com ela um pouco mais rápida. E quando eu vou ouvir a música, penso ‘putz, podia ter feito isso um pouquinho mais rápido’… Mas é o que é, né? Acho que dentro do contexto geral do disco, ela faz sentido. No show é diferente, e como a gente às vezes toca com metrônomo,acaba trazendo a música para trás. Se a gente tocasse ela sem o clique, talvez acelerasse naturalmente. Então a gente optou por acelerar com o metrônomo para poder ter mais essa sensação do ‘ao vivo’ ali, uma emoção maior de estar tocando as músicas. Mas o “Raio” já é rápido naturalmente, então acho pouco possível que a gente vá acelerar alguma coisa.

É difícil tocar com clique. Você está com uma banda fixa te acompanhando ou escolhe músicos dependendo da região que for tocar?
Desde o início do Tagua Tagua até agora, eu toco com a mesma banda. Normalmente sou eu e mais três músicos. Essa banda esteve comigo 98% das vezes que já me apresentei. Não tenho como dizer que vai ser sempre assim, porque as coisas mudam, as pessoas têm suas vidas e seus planos. Mas até o momento foi assim e esse ano a nossa ideia é que continue. A gente já está muito acostumado a tocar juntos, nos entendemos na tocabilidade. Imagina que são pessoas que tocam juntas há 6 ou 7 anos, desde que lancei meu primeiro single, que foi lá pro fim de 2017 para 2018. Tudo bem que o álbum só saiu depois no fim de 2020, no meio da pandemia, mas ainda assim é a mesma banda. A gente já fez centenas de shows, sabe? Então a gente já se entende muito no olhar e isso aí não não se consegue facilmente trocando músicos o tempo todo. Mas a gente sabe que o artista independente tem que se adaptar; nem sempre vai ter as melhores condições e possibilidades, então entendo que em algum momento talvez possa ter que me apresentar sozinho, por alguma circunstância. É uma coisa que faz parte do processo de um artista solo, que é se adaptar um pouco ao meio. É diferente de uma banda; quando uma pessoa não pode, simplesmente não há o show, não há turnê. Um artista solo não, ele tem que enxergar o espaço dele como viável dentro de qualquer circunstância que aparecer, se ele estiver ali disponível.

Entendo que sendo artista solo, você pode ter mais responsabilidades porque é o seu projeto e tem que correr atrás das coisas sozinho. Mas também tem uma certa facilidade de você decidir 100% o que quer. Mas o que exatamente você enxerga de diferente o que você teve no Wannabe Jalva e agora com a sua carreira solo? O que é mais fácil e o que que é mais difícil?
São universos bem diferentes. Me lembro que naquela época, às vezes a gente tinha embates, justamente por não concordar em ideias e decisões. Tinha uma coisa muito democrática, na qual se a maioria da banda achava que era para um lado, ia todo mundo para esse lado. Mas isso nem sempre representava a vontade real de todo mundo na banda. São várias pessoas tendo que decidir uma coisa e isso atravanca demais as decisões. Elas demoram, nunca é simples de estar todo mundo 100% concordando. E isso, dentro de um processo artístico que envolve clipe, criação, música, gravações, é muito mais fácil de fazer sozinho, porque é mais prático. Só que em contrapartida, tudo recai sobre uma pessoa só. E quando você está dividindo essa responsabilidade com um grupo, é como se você tivesse quatro ou cinco sócios e eles estão realmente querendo fazer aquela coisa acontecer. No projeto solo não é assim; tem várias pessoas trabalhando contigo, elas são muito parceiras, mas elas nunca vão abraçar aquele projeto como você. São responsabilidades diferentes. E aí isso é o ônus e o bônus. Mas essa facilidade de lidar, resolver e ir fazendo as coisas no dia a dia, eu não substituiria. Numa banda realmente é muito burocrático em alguns processos.

Voltando ao disco mais recente, queria te perguntar: como surgiu essa parceria com o White Denim na faixa “Lado a Lado”?
Aconteceu porque eu já acompanhava o White Denim há muitos anos, quando descobri a banda em 2011, se não me engano, vendo vídeos na internet. Elles vieram uma vez para o Brasil e fizeram um show em Porto Alegre, mas não consegui ver o show porque estava tocando com a Wannabe Jalva. Quando o Tagua Tagua foi tocar em Austin no South By Southwest em 2022, eu vi um show deles lá. Como esse festival é na cidade deles, acho que já tocaram nele tipo 15 vezes. Depois disso acho que a gente se adicionou no Instagram e mandei mensagem pro James, que é o vocalista. A gente começou a trocar ideia sobre música, artistas que gostávamos em comum e coisas assim. Quando eu tive uma ideia de música pronta, pensei ‘vou mandar para ele, vamos ver se ele gosta’ e ele super gostou. Ele é produtor também e perguntei se ele queria colaborar, fazer alguma coisa juntos e ele colaborou com várias coisas, gravou um monte de guitarras, flautas, percussões, botou vozes na música e elevou ela muito, sabe? Eu mandei uma ideia um pouco mais simplificada, melodia, letra, um piano, um baixo e uma bateria, mas com espaço para ele criar. Daí a música cresceu muito quando ele acrescentou. Foi uma coisa muito espontânea e natural, fluiu muito. Quando eu ouvi, falei: “Caraca era isso, faltava a mão desse cara nessa música”. Acho que casou muito bem também porque são bandas diferentes. Tagua Tagua tem uma sonoridade específica que não é necessariamente similar ao White Denim, mas quando você bota as duas coisas juntas, parece que deu liga, sabe? Ficou a minha cara ali mas a dele também, de certa forma. E eu acho que ele sentiu isso, porque ele gostou do resultado e quis lançar junto em collab. Creio que ele não lançaria alguma coisa que não se identificasse. Acho que tem muito o jeito dele de se expressar na guitarra. Ficou bem evidente. E ficou legal porque tem essa mistura dos dois mundos, que não são iguais, mas se conversam.

Acho que “Raio” é um trabalho um pouquinho mais pop do que o anterior. Digo isso também porque a voz parece mais alta e discernível, com menos efeitos do que os trabalhos anteriores. Você achava que precisava dar mais vazão às letras dessa vez?
Eu acho que não. Essa coisa da voz é muito relativa. Acho que aqui no Brasil a gente tem uma restrição muito grande em relação à estética sonora e do mercado nacional de se instituir que a voz tem que ser uma coisa na frente, com mensagens muito claras, limpa e sem efeitos. E eu não vejo voz assim dentro de uma música, sabe? Vejo a voz como um instrumento fazendo melodias e com efeitos. Muitas vezes eles estão ali justamente para causar uma sensação com o resto da música. Como um instrumento mesmo, assim como uma guitarra. Eu gosto e escuto muitas bandas que tratam dessa forma, e são bandas que no mundo são mainstream. Tipo Alabama Shakes, Tame Impala… posso te citar inúmeros exemplos que a voz tá ‘destruída’ na música. Às vezes ela tá ‘enterrada’, cheia de efeito, causando sensações e não necessariamente falando uma mensagem clara na letra, sabe? Uma coisa é eu cantar só minha voz e violão aqui, com a voz super alta sem nada pra te passar uma mensagem, outra coisa é eu botar várias camadas na voz e levá-la com esses efeitos para um lugar e cantar essa mensagem, vou te passar outra sensação, entende? Acho que no Brasil tem muito essa necessidade que se criou através do mercado da coisa ser limpa. E se não for assim, não toca no rádio, não tem espaço na TV, não tá em lugar nenhum. Sem desmerecer essas pessoas, porque não cabe a mim, mas falando esteticamente, você vai ouvir o Tiago Iorc ou Anavitória, que é uma voz clara sem nada na cara cantando a letra mais clara possível e um violãozinho lá no fundo. Essas músicas que são mainstream no Brasil ou que tem espaço radiofônico, parece que falta coragem de tentar uma ruptura. Porque para mim música é isso: é ousar, é fazer ruído também. É expressão. Dentro da música, enquanto eu tava mixando, achei que esteticamente estava funcionando melhor. Mas não por conta de querer passar uma mensagem mais clara. Eu acho que o “Tanto” tem letras talvez mais profundas do que o “Raio”, mas nem por isso eu me preocupei de deixá-las claras, sabe? O disco da Kali Uchis por exemplo, que é uma artista que nem é rock, a voz é mergulhada em efeitos. Ela tá voando na música e é pop mundial. Mas parece que no Brasil se instituiu isso, é uma necessidade do mercado.

Falando nessa questão de mercado: você já tocou em vários lugares fora do Brasil, como América do Norte e Europa. Como você acha que a sua música é recebida lá fora? Com as mudanças políticas dos últimos anos, você acha que ainda há mercado para artistas brasileiros no exterior?
Eu acho que sim. Acho que sempre vai haver. Tem um interesse muito grande pela música brasileira. A parte que eu vejo como mais difícil é principalmente romper a barreira que se criou em torno da música brasileira como estereótipo. Acho que lá fora talvez ainda seja mais aceita a música brasileira para gringo ouvir, que é uma coisa um pouco mais bossa nova, MPB. Então tudo que vem com esse lado, já parece um pouco mais aberta a porta. Um violão de nylon, um banquinho e é isso. E eu percebo isso circulando, porque eu vou muito para fora desde o início do projeto. Desde 2019 eu tenho ido para fora. Então eu vejo que a parte mais difícil é romper essas barreiras. A música brasileira é um universo gigante de coisas, não só aquilo que se espera da música brasileira. Acho que isso nem é apenas sobre a música brasileira em si. Vejo às vezes quando uma banda turca vai tocar nos Estados Unidos, se espera que ela estará usando aquelas roupas tradicionais deles e tal, tocando alguma música que remete à Turquia. Todo mundo quer isso de alguma forma, né? Trazer esse lance étnico, diferente. Então acho que também esperam isso do Brasil. E romper essas barreiras é um pouco mais difícil. Mas a receptividade para mim sempre foi muito positiva. Vejo pessoas sempre muito interessadas por ser uma banda do Brasil e acho que essa coisa de propor alguma coisa diferente desse estereótipo também abre portas. Tem gente mais curiosa querendo ver o que tá sendo feito no Brasil contemporâneo.

E você, que já excursionou dentro e fora do país depois da pandemia, como acha que ficou o cenário para músicos independentes fazerem turnês?
É difícil responder isso por conta de um motivo: muito do andamento do Tagua Tagua e possibilidades maiores vieram por conta da pandemia, porque eu lancei um álbum, que é o “Inteiro Metade” nesse período. Antes eu tinha lançado EPs e singles, e fui começando a tocar e viajar e perceber como eram as coisas com esses singles e eps. Foi durante a pandemia que muita gente mergulhou nesse álbum e descobriu o Tagua Tagua. Foi ali que eu comecei a ver que pessoas realmente estavam ouvindo e se identificando de fato com as letras, com as músicas e virando fã de alguma maneira. Então tudo que eu construí de mais sólido começou pós pandemia, não antes. Demorei para lançar um disco porque quis criar uma maturidade do projeto. Tentei tocar bastante em 2019 e lancei dois EPs. Fiz todo um movimento antes de partir para um disco. Mas acho que vendo de fora, como músico, acho que não ficou mais difícil, a coisa só mudou e ela é cíclica, ela vai e vem dentro da necessidade. A gente se renova e cria coisas. Muita casa fechou e muita casa abriu, sabe? Eu vejo que hoje tem espaço pros artistas. Não é tão fácil para quem não tem um público instituído, vejo uma dificuldade maior dos artistas porque tem menos coisas menores. Tem festivais um pouquinho maiores e eles pouco incentivam novas bandas. Mas tem o festival do Minuto Indie que é legal, que são cinco bandas que acho bem interessante, porque tenta estimular e fazer com bandas menores, mais de nicho. Então ele acaba tendo que chamar um artista um pouquinho mais conhecido para também movimentar esse público. Mas ele dá oportunidade para artistas que estão mais no início ou tentando formar um público, e isso eu acho extremamente importante. E a cena é praticamente desfragmentada, com cada artista meio que por si, tentando fazer o seu corre e criar os os seus artifícios, o seu caminho. Hoje em dia, me vejo numa posição na qual 90% dos shows que faço sou eu e meu time que organizamos. Então eu sei que eu tenho público X de tantas pessoas mais ou menos em cada estado, em cada cidade e consigo ir fazer o show nessa casa, me organizar para tocar e fazer a coisa se mover. Mas se não tem isso ainda minimamente instituído, é muito difícil, sem apoio.

Que tipo de conselho você daria para outros artistas independentes para fazer a ‘lição de casa’? Para fazer turnês dentro e fora do Brasil, etc.
Ah cara, isso é uma coisa bem complexa na verdade. Se você me perguntasse isso há dois ou três anos atrás, talvez eu tivesse um conselho na ponta da língua. Mas hoje em dia tenho um pouco de receio, porque cada um constrói a sua história e o seu caminho da sua forma. E essa narrativa não se repete, por mais que siga os mesmos passos que eu, você vai chegar em resultados diferentes. E falo isso porque hoje em dia me sinto um pouco responsável por tentar gerar algum tipo de comparação. Acho que tem muito de olhar pro lado, ver o que o outro cara tá fazendo e tentar se espelhar e pode ser muito frustrante. Pode ser um grande motivo de desistência, porque é muito fácil você desistir e pensar: “Putz eu tô fazendo tudo aqui da cartilha e a coisa não tá andando”. Então acho que a melhor forma é ir fazendo e encontrando o seu jeito. Vai ser sempre difícil, nunca vai ser fácil. E cada vez mais dentro desse lugar vejo isso. Primeiro você quer alcançar alguma coisa, e aí é difícil, mas você consegue alcançar naturalmente e depois precisa alcançar uma outra coisa maior então é um processo sem fim. E tem que ter muita força de vontade, obstinação, tem que querer muito fazer isso acontecer. E tentar trilhar seu próprio caminho, descobrir qual é a forma que funciona dentro de vários cenários. Perceber onde e como que a sua música chega, saber quem é o público que tem interesse de ouvir as coisas que você tá querendo dizer, e aí depois de entender isso, o que você consegue fazer com a condição que você tem. Porque não adianta sair falando que a pessoa tem que fazer X, Y e Z se não tem nenhuma condição de fazer nada, sabe? Então é buscar isso. Buscar pessoas que acreditam no teu trabalho tanto quanto você, que compram essa ideia, porque sozinho ninguém faz nada. Então é importante ter ajuda. Ao longo do meu processo, fui construindo essas redes, conhecendo pessoas que também acreditam, que veem potencial no trabalho. Parece muito fácil falar que eu vou para fora [do país] e faço shows, mas na verdade eu tenho uma galera que foi se construindo, trabalhando comigo e me ajudando a dar esses passos e a construir esse trabalho. Acho que foi uma mistura de um desabafo com conselho, mas tá aí (risos)

E quais são os próximos passos do Tagua Tagua?
Bom, o disco acabou de sair, então o próximo passo é realmente anunciar turnê. A gente vai fazer shows pelo Brasil basicamente no meio do ano. Eu ainda não posso falar exatamente quais são os lugares porque ainda tem umas definições para sair nos próximos dias. E a gente vai fazer uma turnê fora em julho também, abrindo a turnê do White Denim. Então vai ser uma correria maluca, com 18 shows em 19 dias. A gente começa a turnê do Brasil no final de junho, passa para fora em julho, depois volta e vai até setembro. Por aqui são basicamente uns 10 shows. E aí é isso, a gente vai sair divulgando o disco esse ano. Fazer o “Raio” sair do papel para ir pro mundo, sair do streaming para ir pro ao vivo. Acho que é um processo novo criar o show para o palco, pensar como vai ser e tal. E essa parte de conseguir chegar nas pessoas com um show novo, com uma energia nova e ver como é que isso vai se comportar é muito legal. Acho que vai ser diferente, mais dançante, então eu tô bem animado para levar isso pra galera.

– Alexandre Lopes (@ociocretino) é jornalista e assina o www.ociocretino.blogspot.com.br